sábado, 12 de abril de 2014

A boçal arte do mal dizer.


A Calúnia de Apeles, óleo por John Vanderlyn


Nasci com a sensatez de perceber que falar sobre a vida alheia nos atrasa a nossa própria. Há medida que se amadurece, vão-se limando as arestas, não para chegar a Brâmane, mas, pelo menos, para encontrar um pardo equilíbrio. Há uns dias, numa saída entre amigos, reparei numa moça, com os seus vinte e poucos anos, muito feia de rosto e de mau gosto assumido, que ia muito para além da postura alcoviteira. Passou toda a noite em comentários menores, toda tesa nas convicções deturpadas pela nobre arte de apontar o dedo, porque assim lhe apetecia. E fulana e sicrana eram cozido e assado. Prestou-se a tanta tonteria que cheguei a um momento que me esqueci da sua existência.   
Vai daí, pus-me a pensar na quantidade de tempo e energia que muita gente despende a criticar, a enxovalhar e a denegrir a imagem alheia. Esta gente, digo-vos já, devia nascer sem língua, para que o veneno se revoltasse nas entranhas, sem a forma de palavras e nos dispensasse de tamanha boçalidade e mal estar. 
Em boa convicção de que todos nos comportamos de forma menos polida, de vez em quando, não nasci com tolerância para gente de tamanha estupidez. São famílias em disputa verbal, são amigos da onça que, viram-se as costas, e maldizem-se sem pudor, são as relações amorosas fracassadas que se transformam em verdadeiras batalhas ardilosas... É, portanto, um manancial de tolices que poderia fazer-nos perder uma eternidade a dissecar comportamentos. Creio, acerrimamente, que a cada um de nós nos cabe o lugar devido e espalhar os tentáculos pela vida alheia é uma prova de um carácter mesquinho e anti-evolutivo.  Vai-se a ver e, já que se inventa tanta coisa, criam-se por aí umas salas do mal dizer, ao jeito de uma boa tertúlia, e privam-nos, alegremente, da presença desta gente. Valha-nos a boa educação que nos ensina que perseverar no cumprimento do seu dever e guardar silêncio é a melhor resposta à calúnia e à infâmia

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