quarta-feira, 1 de julho de 2015

Mais vale uma tonta com bom coração do que uma mulher inteligente e maléfica.

Jessica Chastain e Octavia Spencer, em The Help

Não há maior defeito numa mulher do que a sua falta de compaixão. Tolero com ligeireza e até uma certa curiosidade senhoras burrinhas, mas que entendam a sua condição e tentem minimizar os danos. É mais fácil aceitar e conviver com alguém pouco inteligente, mas de bom coração, que demonstra transparência no discurso e que usa de ações nobres para estar no mundo.
A inteligência, para o bem ou para o mal, é uma arma poderosa que, se usada por alguém maquiavélico pode ter consequências devastadoras.


Está certo que sou apologista que as pessoas se cultivem, tentem evoluir intelectualmente. E até creio que só pessoas demasiado faustosas travam a sua evolução natural. Costuma dizer-se que a humildade antecede a honra. Se não nos colocarmos numa posição mais vulnerável dos seres, como poderemos ser magistrais e compreender toda a essência da vida?
Sobre este assunto, a título de exemplo, lembro-me da bonita obra de Tate Taylor, baseada no livro homónimo de Kathryn Stockett - The Help - que soube observar de forma ímpar, os recantos mais obscuros dos bairros da classe média alta de uma pequena cidade no Mississipi.
O casal Foote, em The Help

Sobre a obra, muito bem retratada no filme, um marco nos anos 60, para os Direitos Civis nos Estados Unidos, que incide maioritariamente sobre o drama das más condições a que as empregadas domésticas estavam sujeitas, para além da personalidade muito rica das empregadas a dias e babysitters, verdadeiramente amorosas e pacientes; da crença inabalável e do caráter sindicalista de Eugenia; a personagem que mais me marcou foi Celia Foote, interpretada pela deslumbrante Jessica Chastain.
Celia, nascida numa família humilde, sem grandes posses, teve um passado de tropeços. Em jovem deixou a escola, teve inúmeros romances com verdadeiros trastes, era ingénua, humilde, despretensiosa e linda de morrer. Razão pela qual, um cavalheiro de boas famílias haveria de lhe fazer a corte, deixando de lado uma antiga namorada, azeda e mesquinha, de famílias abonadas, com uma instrução privilegiada - Hilly Holbrook - que nunca conseguiu superar a desfeita.
Desde o momento em que o casal Foote chegou à cidade de Jackson , houve todo um alarido à volta de Celia e do seu elegante esposo. Johnny Foote nunca se mostrou alarmado e convivia tranquilamente com os cochichos da vizinhança. Para a esposa, cujo objetivo era ser aceite nos círculos sociais, nas tertúlias maçadoras das senhoras de bom nome do burgo, a vida não foi fácil. Celia tinha um coração de ouro, era linda, vestia maravilhosamente - embora lhe criticassem as roupas coleantes e os decotes profundos -, muito afável, mas tinha um passado pouco abonatório, uma parda instrução e ousara "roubar" um pretendente de Hilly, cuja família tinha imensa influência no círculo político e social da cidade.
Hilly Holbrook, em The Help.

Hilly, elegante de uma forma mais discreta, snob, narcisista, preconceituosa, representava a antítese da rival. Ociosa, gostava de passar os seus dias em reuniões com as amigas, onde se entretinham na maledicência, aborrecia-se com os deveres maternais e relegava responsabilidades que só a ela competiam à empregada doméstica. Acreditava, empedernida, que pertencia à estirpe superior, distratava os empregados, histérica e intransigente, cria  que a educação, o berço e o dinheiro lhe conferiam um estatuto intocável e um inabalável valor moral.  Detestava afincadamente Celia e tudo o que representava. Vedava-lhe a entrada nas festas, humilhava-a quando a oportunidade surgia, usava a sua inteligência para o mal. Celia, infelizmente, por ser tontinha, apesar de excelente pessoa, não conseguia responder-lhe à letra, amuava, entristecia-se, isolava-se em pranto. Trazia no peito uma dor imensa, almejava a maternidade, mas teve de aceitar a sua fortuna.
Johnny amava-a por toda a sua bondade, pela compaixão que demonstrava pelas pessoas - a sua melhor amiga era a sua empregada doméstica, espezinhada outrora por Hilly -, por ser espontânea, por o que lhe faltava em inteligência, em fluência de francês, em regras de etiqueta, em esmero na cozinha, ser contrabalançado com a beleza de espírito.
Ora podem-se tirar bastantes ilações da história de Celia e Hilly, nem que não seja o facto de que ser graciosa tem mais a ver com bondade do que com uma afanada cultura geral, uma instrução exímia, que serve de bandeira para encher o peito e que, no final das contas, se usada para fins pouco poéticos, é apenas mais uma caraterística pueril.



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