domingo, 4 de janeiro de 2015

Anda a rir-se o roto do esfarrapado.


Cena do filme The Help (2011), de Tate Taylor. 


Ontem fui incumbida, por uma amiga, de ir a uma loja apinhada de gente em busca de um artido que, afinal, já havia esgotado. Acabei por comprar alguma coisa da qual precisasse verdadeiramente, dado que já tinha feito uma viagem de mais de vinte minutes a pé. Adiante, que não é sobre isso que vos venho falar. Isto para dizer que, no tempo que estive na fastidiosa fila de pagamento, ouvi um discurso memorável. Primeiramente, pareceu-me daquelas conversas chatas de mulheres. Que fulana tinha comprado não sei o quê, que tinha muito mau gosto, e que agora parecia uma matrafona. Mas a coisa foi-se adensando:

-  Pois, está gorda e mal feita. 
- Ela contou-me que vai todos os dias ao ginásio... não sei como está naquela figura. 
- Ah pois, o ginásio... que feche é a boca que ela come muito. Agora veio-me dizer que era por causa do filho, para não fazer duas comidas. Eu desde que tive o meu, que faço isso para manter a forma. É preciso fechar a boca, é o que é! 

Ora pus-me a pensar sobre o tipo de alimentação das pobres alminhas dos seus filhos. Comiam um leitão da Bairrada ao almoço e feijoada ao jantar, para se verem obrigadas a fazer pratos diferentes?! Pareceu-me demasiado rebuscado e até de um certo dramatismo clássico. Porém, quem me lê deve considerar que a senhora que insultava acerrimamente as formas avantajadas da outra era uma mulher elegante. Desenganem-se. Ao olhar para trás, de soslaio, deparei-me com uma pessoa, com menos de 30 anos, cara deslavada e olhos de quem acordou não faz grande tempo, um corpo grande e volumoso, com coxas que, seguramente, seriam duas pernas das minhas, e tudo isto trilhado - não me ocorre outra palavra, que me desculpem - num casaquito de algodão e umas leggings medonhas, de tecido melindroso, daquele que quando se estica, vira transparente (as lycras desta vida). E já dizia a minha avó, muito sabiamente, que anda por aí muito roto a rir-se do esfarrapado e muito sujo a rir-se do mal lavado.  

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